terça-feira, 26 de junho de 2007

Em defesa da história e do ensino de história

José Luciano de Queiroz Aires*

Gostaria de iniciar esse texto fazendo dois comentários introdutórios. O primeiro diz respeito ao espaço cibernético para o qual endereço essa narrativa. Trata-se, como sabemos, de um blog que divulga as idéias, pesquisas e reflexões dos acadêmicos do curso de Licenciatura em História da UEPB, cuja iniciativa merece reconhecimento. Daí, venho justificar minha participação como internauta, navegando por esse blog e remando em águas turvas ao lado de tantos e tantos marinheiros que se aventuram na difícil missão de refletir sobre o conhecimento histórico. Entre esses, gostaria de mencionar os alunos de graduação do nosso curso, para os quais (claro que não excluindo outros leitores) dirijo essas palavras.

Um segundo comentário, ainda que imbricado ao primeiro, consiste em justificar o título desse artigo. Escrevo marcando posição, pois não sou ingênuo a ponto de cair num “positivismo” e pensar a História como única verdade e, portanto, propor “resgatar os fatos tal qual eles aconteceram”, parafraseando Leopold Von Ranke. Como diria Certeau, o historiador fala a partir de um lugar social. Reconheço, pois, o lugar de minha fala e tenho devida consciência das implicações subjetivas nela contidas. Sendo dessa forma, gostaria de adiantar que pensei em escrever esse texto para provocar discussões as quais muitos alunos e professores universitários de História se esquivam de fazê-las.Tais discussões remetem para a questão do ensino de História na Educação Básica, ou seja, para o nosso campo de atuação profissional, de onde viemos, do qual, às vezes, algumas pessoas parecem esquecer, e para onde deveremos voltar, se quisermos ser um profissional de História.

Feitas as justificativas iniciais, passo agora a tecer alguns comentários sobre a nossa identidade de Historiador e sobre aspectos teórico-metodológicos e práticos do ensino de História.

Uma primeira interpelação que julgo necessária, é com relação a nossa identidade. Afinal, o que é ser historiador hoje? Que curso estou fazendo? Para que estou cursando uma licenciatura em História? São perguntas sobre as quais precisamos refletir. Evidentemente que não há consenso nas elaborações de repostas, tendo em vista que perpassam por questões epistemológicas bastante polêmicas.

Nesse particular, faço coro com o pensamento da ANPUH. Devemos ter em mente que o ofício do historiador, esteja ele no ensino básico ou superior, é produzir e socializar conhecimento histórico. É preciso que quebremos hierarquias institucionais que conferem à universidade, com toda uma aura simbólica, o lócus privilegiado da produção do conhecimento, portanto, lá estariam os pesquisadores, e à escola compete transmitir conhecimentos produzidos de cima, portanto, lá estariam meros professores. Como nos lembra Rosa Godoy, o profissional de História do século XXI, esteja atuando em qualquer das instâncias do ensino, é um professor/pesquisador pois, na escola também se produz conhecimento. Nossa identidade, pensada por esse ângulo, converge para a extinção dos cursos de bacharelado e licenciaturas de forma separada e, em lugar desse sectarismo que, tenhamos cursos de licenciatura em História que forneçam os fundamentos da pesquisa histórica e do ensino como sendo faces diferenciadas mas, de uma mesma moeda.

Uma perguntinha aparentemente boba, mas que de boba não tem nada, pelo contrário, revela bastante inteligibilidade, é feita vez por outra pelos nossos alunos do ensino fundamental e médio. “Professor, para que serve estudar História?” Esse questionamento tem apanhado muita gente em sala de aula. Afinal, responder não é tão fácil assim, requer fundamentação teórico-metodológica atualizada, que parece não ser a tônica da prática pedagógica em nossas escolas. Por isso, faço questão de ressaltar a importância dos componentes curriculares de Prática de Ensino no nosso curso de História. São oportunidades para que possamos discutir essas fundamentações e problematizar o cotidiano escolar. As teorias e metodologias da História também são importantíssimas para planejarmos nossas aulas, elas não se restringem à pesquisa, entendida como a produção de uma monografia, uma dissertação ou uma tese, o que mostra que os componentes da área de ensino de História não estão apenas para ensinarem os futuros professores a usarem retroprojetores, mas se encontram muito além disso.

Precisamos pensar que curso estamos fazendo e para quê. Se parto do princípio de que estou me formando um professor/pesquisador de história, é necessário nos desterritorializarmos do restrito espaço acadêmico e buscarmos enxergar para além dos muros entre os quais, muitas vezes, fazemos questão de nos confinar. O que vemos, frequentemente são professores universitários e alunos (muitos dos quais seguindo o discurso daqueles), se transformando em minotauros, fechados no labirinto da universidade e fazendo questão de fechar todos os corredores para que não entre o fio de Ariadne e, assim, possam enxergar o mundo lá fora.

Face ao silêncio dos políticos diante dos problemas sociais, Bourdieu passou a apelar para a mobilização dos intelectuais. “O que defendo”, costumava dizer, “é a possibilidade e a necessidade do intelectual crítico”. Para Bourdieu, não pode haver democracia efetiva sem um verdadeiro contra-poder crítico. O sociólogo dedicou os seus últimos anos de vida a combater o neoliberalismo sob todas as suas formas. Colocou os seus conhecimentos científicos a serviço do empenhamento político. Numa de suas últimas obras, Contre-feux 2, Pour um mouvement social européen, Bourdieu afirma: “Fui levado pela lógica do meu trabalho a ultrapassar os limites que eu mesmo havia estabelecido em nome de uma ideia de objectividade que, percebi, era uma forma de censura”. Ultrapassar esses limites, para ele, significava tirar o saber para fora da “cidade dos sábios” e colocá-lo a serviço das lutas sociais contra o neoliberalismo.

Como intelectuais, historiadores de nosso tempo, devemos manter o compromisso com o mundo social, cultural, político, não no sentido de fazer a revolução, mas educarmos cidadãos críticos. A escola é o nosso campo de atuação por excelência. É nela que atuarão os futuros graduandos, no nosso caso de História. É um verdadeiro palco composto por diversos atores e diversas representações de mundo, uma verdadeira polifonia. É um espaço no qual se engendram problemas, muitos dos quais como reflexo do sistema. Não é um céu, afinal, se o fosse, todos queriam ir. A julgar pelo que relatam nossos estagiários, bem como pelo que tenho observado como professor orientador de estágio, nossa escola pública está em crise. Portanto, se não temos a receita do milagre para curá-la, também não podemos fechar os olhos para seus problemas ou pior ainda, enxergar os erros e continuar neles.

Não quero partir de uma única definição sobre a escola pública no Brasil. O que tenho em mente, nesse momento do texto, é resumir aquilo que consideramos problemas emblemáticos concernentes a ela. Alguns desses problemas têm sido observados por mim no trabalho de campo acompanhando os estagiários.

Os governos, atendendo aos requisitos da cartilha neoliberal do capitalismo globalizado, ensejam na mídia uma propaganda que não condiz com a realidade escolar. Ao ensaiarem mudanças, estas se configuram numa ótica quantitativa e não qualitativa. Propagam que as escolas têm vagas para todos que querem estudar, mas esquecem de refletir sobre as condições de aprendizagem em uma turma de aproximadamente quarenta alunos. E por aí começam a fazer uma aritmética operando a calculadora do Banco Mundial: mais vagas, mais livros didáticos, mais programas de alfabetização de jovens e adultos, mais merenda escolar, o que é igual a mais alunos nas escolas, mais aprovados, menos evasão, menos repetência, mais financiamentos externos, e por aí vai.

Não quero aqui dizer que não sejam interessantes os investimentos em materiais didáticos, a reforma curricular. O que insisto em dizer é que os objetivos dos governos são pautados apenas em números com a finalidade de vender uma imagem de país cuja educação “vai muito bem”, aos credores internacionais, inserindo o Brasil nessa nova ordem mundial. Daí não pensam na qualidade do ensino, na criticidade do mesmo, na formação continuada dos professores, numa justa política salarial para os docentes. Eu não consigo perceber um ensino de qualidade, por mais atualizado que seja o profissional, quando este tem uma carga horária de 20 horas aulas para receber em média 600 reais, o que, por questão de sobrevivência, o obriga a dobrá-la para receber 1.200! Vale lembrar que na Educação Básica são 40 horas de sala de aula, sem contar o tempo de planejamento, correção de trabalhos e provas, reuniões...

Para piorar ainda, um componente epistemológico se coloca como complicador da situação. Refiro-me às idéias pós-estruturalistas na esteira de Foucault, sobretudo, no que tange ao niilismo e ao relativismo. Nesse ponto do texto, prefiro chamar uma experiente e compromissada historiadora da UFRN para o debate. Trata-se da professora/pesquisadora Denise Matos Monteiro que tem feito uma reflexão sobre a pós e a graduação de História daquela universidade potiguar, e que me motivou, ainda mais, a escrever esse texto pensando a UEPB.

Participando de uma mesa redonda intitulada “A Pós-Graduação em História da UFRN: um espaço de continuação dos profissionais de História”, na I Semana de Estudos Históricos da UFRN, Denise Monteiro questionava: o que deve ser uma Pós-Graduação e um profissional de História hoje? Ao esboçar respostas, ela afirma que nosso ofício é o de produzir conhecimento, visando compreender as várias dimensões históricas dos homens no tempo, opinião com a qual concordo plenamente.

Entretanto, é aí que aparece o complicador que assinalei anteriormente, a questão do relativismo e do ceticismo do pensamento foucaultiano. Sobre ele, concordo com a historiadora da UFRN quando resume que “Nessa tendência, parte-se da idéia de que o real não existe. Só o que existe são representações do real, ou seja, discursos. Como todo discurso carrega subjetividade, as representações do real não podem apreende-lo, porque são relativas. É quase um Positivismo às avessas: se antes se fazia o elogio da objetividade, agora, se faz o elogio da subjetividade.” Se eu não posso compreender o passado, se eu não posso educar pelas teorias críticas, cortadas algumas arestas, se eu não posso trabalhar na linha do verossímil, por que estou fazendo o curso de História? Para que? Ai sou obrigado a retomar a perguntinha que os alunos nos fazem nas escolas: Afinal, para que estudar História? Será que a única função da História no currículo é ser um mero discurso e o ofício do historiador um mero contador de discursos?

Segundo Jaime Pinsky, (2005, p. 18), em resposta às decepções com o socialismo (real ou idealizado) e ao avanço da ideologia neoliberal, o desencanto com qualquer projeto que contemple o comprometimento com as questões sociais e humanistas tem tomado conta dos profissionais de História. Porém, como coloca o autor, “no lugar da utopia abandonada parece ter ficado um vazio”, entretanto, “não podemos correr o perigo de, junto com a água do banho, jogar fora também o bebê.”

Educar para a temporalidade da sociedade complexa, para as questões do presente histórico, entre elas a globalização, o neoliberalismo e suas várias facetas, incluindo a questão do multiculturalismo como uma questão de cidadania, de discurso contra-hegemônico. Como nos mostra Rosa Godoy, a História-conhecimento não pode reduzir seu olhar a apenas uma de suas dimensões. Para a autora, “Vale dizer que a crítica ao unidimensionalismo de perspecitva não cabe só ao economicismo marxista, mas ao culturalismo, ao politicismo, etc; e que, sendo crítica ao economicismo marxista também deve sê-lo ao economicismo liberal capitalista em sua linearidade mercadológica, crítica esta quase ausente nos meios acadêmicos, o que, no mínimo, é estranho ou revelador.”

Assim, se não temos um currículo escolar crítico, que procure compreender as questões do passado para nos dar respostas no presente, questões essas que perpassem pelas dimensões políticas, econômicas, sociais e culturais, só posso entender que, direta ou indiretamente, acabamos nos tornando intelectuais que cortejam o capitalismo. Ora, isso é bastante simples de explicar: se planejo um ensino que prima apenas por conteúdos como bruxaria, sexualidade, amor, morte, doença, religiosidades, etc (não que estes não devam constar no currículo, longe de mim pensar nisso), tal planejamento acaba agradando por demais às elites donas do poder e da exploração.

Partindo do pressuposto de que nós somos historiadores do tempo presente e que, ao olharmos para o passado, sempre o fazemos partindo das preocupações de nossa temporalidade histórica, eu fico me perguntando por que tantos profissionais de História abominam a discussão sócio-econômica e política na linha das teorias críticas renovadas. Que me permitam ser irônico nesse momento, pois se não fosse tão trágico, no mínimo, seria muito cômico. Globalização e neoliberalismo não existem mais; o Aparelho de Estado é realmente a maior expressão de democracia e cidadania que se tem visto nos últimos tempos; a desigualdade social é coisa dos anos 1970; as estatísticas demonstram que o desemprego, a cada dia, tem diminuído e a renda tem sido distribuída eqüitativamente; os representantes do povo, até que enfim, não fazem mais tráfico de influência, nem nepotismo, nem usam a máquina estatal em proveito de particulares. Enfim, parece que o capitalismo é coisa do passado mas, na verdade, é um adeus de muitos intelectuais à crítica a esse sistema.

Hoje, em plena pós-modernidade, questões de discriminações para com as chamadas minoria são problemáticas do debate e das preocupações de teóricos pós-críticos. Portanto, é dessa configuração contemporânea e dos objetivos de afirmação das identidades plurais que é lançado o olhar para o passado, a fim de entender os conflitos e preconceitos que foram fomentados pelo discurso da modernidade. Da mesma forma, não podemos partir da informatização e da robotização do presente para as primeiras máquinas inglesas do século XVIII? Não podemos partir da questão da cidadania e da república contemporâneas para buscarmos a gênese dos conceitos e das implicações políticas nas sociedades greco-romanas? Não podemos partir do MST de hoje para as Ligas Camponesas dos anos 1960?

Pelo exposto até aqui, fica bastante perceptível a linha de raciocínio que se resume no título desse artigo. Escrevo para defender a História e o nosso ofício de produtor de conhecimento, partindo de uma corrente teórica realista (não a verdade da escola metódica) baseado em autores como Giovani Levi, Thompson, Hobsbawm, Carlo Ginzburg, lembrando que, para este, “a retórica não é incompatível com a prova.” Escrevo para defender o ensino de História e alertar para o fato de que quem está trabalhando numa licenciatura, deverá, no mínimo, refletir sobre o espaço escolar como nosso campo de atuação, antes de esnobar ou silenciar, sob o risco de ter que mudar de curso.

Na minha modesta opinião, se eu não posso compreender as ações do homem no tempo e se os fatos não me interessam nas investigações históricas, vejo que logo, logo, poderá ser assinado o atestado de óbito da nossa profissão.


Referências


WEISSHEIMER, Marco. O legado crítico de Pierre Bourdieu. Revista Espaço Acadêmico, ano I, n 10, março/2002.


PINSKY, Jaime. Por uma História Prazerosa e conseqüente. IN: KARNAL, Leandro (Org.) História na sala de aula: conceitos, práticas e propopstas. 3 ed. São Paulo: Contexto, 2005.


SYLVEIRA, Rosa Maria Godoy. A Formação do Profissional de História para o século XXI. Conferência apresentada no XI Encontro Estadual dos Professores de História (ANPUH/PB) Campina Grande, 14 de julho de 2004.


MONTEIRO, Denise Matos. A pós-Graduação em História da UFRN: um espaço de continuação dos profissionais de História. Mesa redonda da I semana de estudos históricos da UFRN. Natal, 15 a 18 de maio de 2007.

* Professor Ms. do Departamento de História e Geografia da UEPB

quarta-feira, 13 de junho de 2007

A Sexualidade e a Paixão


Erilane Dainne Sousa Oliveira*

Entender a sexualidade é uma tarefa bastante complexa, que interliga vários aspectos (sociais, culturais, religiosos e políticos). A sexualidade interfere, diretamente em nossa conduta e em nossos sentimentos como, por exemplo, à “paixão” que por si só consegue abarcar diversas contingências do “sentir” (medo, desejo, prazer, culpa, depressão, felicidade, identidade ¹).

Viver plenamente a sexualidade, sempre foi uma tarefa muito complicada, por dimensionar muito mais do que o ato sexual (corporal) em si. Viver a sexualidade é sentir, agir e pensar de uma forma, que há tempos foi imposta, construída, e não descoberta e escolhida. É através da sexualidade que podemos expressar significações da nossa personalidade, ou seja, a maneira como enxergamos o mundo, os princípios morais e éticos que acreditamos, ou melhor, que nos fizeram acreditar. Na verdade, a formação da nossa sexualidade é fruto de uma imposição das redes de poderes da sociedade em que vivemos, e que nós por vezes aceitamos tal imposição.

É interessante observar que quando a sexualidade vira um objeto de estudo (curiosidade) no século XIX, ela veio imbuída de várias contradições em seus discursos, prevalecendo aparatos ditatoriais que tentavam regular, normatizar e naturalizar. Enfim, o objetivo maior era instaurar saberes que produzissem “verdades”, que deveriam ser seguidas. Nesse contexto, o conceito “homossexual” é criado, para da afirmação de normalidade ao sujeito “heterossexual”.

A sexologia no século XIX, com ajuda de outros saberes (psicologia, biologia e da antropologia) inseriu-se, como peça fundamental para organizar o modo de como pensamos o corpo e sua relação com a sexualidade. Vale a pena ressaltar, que muito do que se criou como regra, imposição do que pensamos sexualidade está infimamente pelo o fato de que a sexualidade ser uma “construção social”, sendo um dispositivo histórico. Ou seja, possuí múltiplos discursos, e muitos com intuito de docilizar os corpos e as mentes.

Neste ínterim, remeto mais uma vez aos “sentidos da paixão”, que por causa das regras tidas como convencionais, instaurada e vista por muitos como universal, acabou por introduzir em nosso corpo e mente, a vergonha, o medo, a culpa, a censura. Por que tanto a sexualidade como a paixão, através de um extenso “fardo discursivo histórico”, criou uma pluralidade de estratégias de disciplinamento. Enfim, uma repressão que segundo Freud, está ligada a assídua atração pela “paixão pela ignorância”. Controlar nossas paixões e a nossa sexualidade seria um “dever”, por vezes foi visto, como um bem estar social, moral, ético, religioso e até político.

Devemos ter em mente, que a produção de um sujeito é um processo plural e permanente, que de certa forma, esse sujeito participa ativamente na construção de sua identidade. Relembrando, que a escola tem um papel fundamental na criação da identidade do dito “normal”, por ela tentar equilibrar no incentivo a sexualidade “normal” e no seu controle. Em síntese, a sexualidade é uma prerrogativa da vida adulta e a ser praticada com o sexo oposto. Essa pedagogia da sexualidade na escola tem por mérito, o disciplinamento dos corpos, de forma sutil, discreta e por ser continua se torna bastante eficiente e duradoura. Deixando marcas profundas, em quem é submetido a tal educação.

A dessexualização do espaço escolar foi e é algo preponderante, até os dias de hoje. Neste ínterim, é preciso pensar a sexualidade de forma mais abrangente, rompendo fronteiras de tempo e espaço. Desconstruíndo tudo o que impede a imaginação, a curiosidade, deixando fluir o “Eros”, que habita dentro de nós. Tornando os discursos sobre sexualidade “plural”, levando em consideração a transitoriedade do espaço geográfico sexual, ou seja, a enorme gama de possibilidades de se viver e sentir a nossa sexualidade.

Ressaltando bem que a forma de como pesamos o nosso corpo é de suma importância, porque ele expressa tanto a dor como o prazer, que está intimamente ligado com a nossa maneira de agir conforme no que acreditamos ser o certo, o melhor. É através do nosso corpo, que exprimimos nosso comportamento sexual.

A partir das transformações, que ao longo dessas últimas décadas o mundo vem sofrendo, outras discussões trazidas pelos movimentos feministas, a consciência auto-afirmativa de gay e lésbicas e movimentos de raça, engajaram pessoas numa nova luta, que propõe novas formas de se relacionar com a sexualidade “alternativa”. Criando discursos que tentam mostrar o reconhecimento do “outro”, em toda sua diversidade social e sexual. Por isso é importante problematizarmos as estruturas de dominação e subordinação que a sexualidade sofre, nas contingências de gênero, classe e raça.

É importante pensar a sexualidade de forma mais ampla onde o “Eros” prevaleça. Repensar as formas que aprendemos o discurso da sexualidade é um bom caminho para aumentar nossos horizontes, que a tanto foi silenciado e reprimido.

Sempre brinco, que minha vida é movida por “paixões”. Paixão pelos momentos, pela natureza, pelas pessoas, e principalmente pelas mudanças, enfim, por tudo que me faça sentir viva e “diferente” do que é imposto. Pensar a sexualidade com paixão é permitir que o “Eros” tome conta da sua mente e do seu corpo. É deixar que, movida pela paixão, que nos faz sentir e agir “involuntariamente”, ou melhor, agir e sentir de forma diferente das normas estabelecidas como “normais”, para que você se reconheça intensamente com o que é diferente, sem choque, sem culpa.

Acredito que a sexualidade é comparável ao um oceano, imenso e cheio de mistérios que precisa ser desvendada. A sexualidade deve ser observada em sua densidade, e através de pequenos sinais de olhares, gestos e palavras subjetivas. E devemos lembrar que antes de dizermos que respeitamos o “outro”, não só exterior, mas o “outro em nós” devemos refletir se realmente o aceitamos, por que não existe respeito onde não há aceitação.

Pensar, falar e enxergar a sexualidade exige uma entrega à intensidade que só pode ser comparada a uma paixão, ou melhor, a o Eros. “Ao próprio Deus do Amor!”.

Nota:

1 - A palavra “identidade” encontra-se nesse contexto, como algo pensado e vivido pelo sujeito, que não só é influenciado pela conjuntura do meio em que vive, como também pela paixão de suas identificações com o diferente, com o plural.

Referências:

LOURO, Guacira Lopes (org.). O Corpo Educado – Pedagogia da Sexualidade. Tradução: Tomaz Tadeu da Silva. Belo Horizonte: Autêntica, 1999.

* Acadêmica de História UEPB / safira_cg@yahoo.com.br